O passeio mais radical de Bonito, MS, é também o mais impressionante. Não é pra menos. Pra poder ver de perto toda a beleza do Abismo Anhumas, você precisa descer por 72 metros do topo ao chão! E de rapel!

Foto: Marcio Cabral / www.abismoanhumas.com.br

A preparação

A aventura começa no dia anterior. O visitante é obrigado a passar por um treinamento pra poder entender em que está se metendo.

E não é exagero! No centro de Bonito fica a sede da única empresa responsável pela experiência radical. Ao chegar lá, 16 profissionais estão a postos pra explicar como tudo funciona.

Primeiramente, ficar atento à vestimenta é essencial. A recomendação é ir de calça (exceto jeans) ou bermuda na altura dos joelhos (sem ser jeans também). Tênis são obrigatórios.

Treinamento na sede da Abismo Anhumas, no centro de Bonito, MS

Então, os monitores vão colocar o equipamento de rapel em você – sempre verificando se está tudo bem preso. Na sequência, é hora de fazer a subida manual movimentando os braços e os pés (cansa bastante!) até uma plataforma que fica a uns 10 metros de altura. Isso serve pra que você se familiarize com as cordas, os movimentos e a altura!

Lá em cima, outro profissional troca rapidamente a posição das cordas e ativa o mecanismo de descida, que é totalmente controlado por você no treinamento. Descer demora segundos… Pronto, teste concluído!

Aí, é hora de assinar o termo de responsabilidade (ou desistir) e fazer o pagamento do passeio. É a atração mais cara da cidade, custa R$ 1.120,00 por pessoa! Neste valor NÃO estão incluídos alimentação e o transporte até o abismo.

(Em Bagan, no Mianmar, deixei de fazer um passeio de balão caríssimo e me arrependi. Por isso, com planejamento, encarei esse).

Descida no treinamento de rapel

Atenção! Depois de assinar e pagar (dá pra parcelar em até 3x), o dinheiro não é mais devolvido em caso de desistência.

O próximo passo é provar a roupa de neoprene para a flutuação que será feita no lago da caverna. E pronto, basta aguardar o dia da aventura.

O que é o Abismo Anhumas

O Abismo fica numa fazenda, a uns 20 quilômetros do centro de Bonito. Foi descoberto na década de setenta, quando o fogo colocado pra desmatar o terreno acabou se alastrando mais do que devia.

Então, alguns funcionários da fazenda encontraram o imenso buraco no chão, numa área mais distante, e perceberam que, lá embaixo, havia um universo totalmente inexplorado.

Abertura do Abismo Anhumas visto de baixo
Foto: Marcelo Krause / www.abismoanhumas.com.br

Após estudos de especialistas brasileiros e estrangeiros, que desceram primeiro para explorar a caverna na década de 80, o lugar foi aberto aos turistas a partir de meados dos anos 90.

As pesquisas indicam que a abertura do Abismo aconteceu há uns 10 mil anos e que a imensa caverna embaixo da terra se formou entre dois e quatro milhões de anos atrás.

O início da aventura

Apenas 30 pessoas, no máximo, podem visitar o Abismo Anhumas por dia. Tudo é controlado para que se interfira o menos possível no ecossistema lá embaixo.

Os grupos de até dez pessoas têm horários marcados (7h30, 8h30 ou 12h30 – este último só em feriados ou alta temporada). A estrutura do lugar não é tão moderna: existem banheiros químicos em cima, antes da descida, e não há alimentação disponível. Leve a sua!

Antes de iniciar a descida, você pode ir até um mirante observar o imenso buraco. Dá medo. Avalie bem se você vai querer ver antes de encarar o rapel. É sério!

Depois, os simpáticos monitores (são mais ou menos dez!) vão colocar todo o equipamento em você (inclusive os capacetes. Solicite os que têm suporte para GoPro, se decidir levar a sua. Mas não esqueça de levar a base para fixá-la).

Sua bolsa – ou mochila – com celular, roupa de banho e toalhas desce separadamente e sem problemas.

A descida de rapel!

Os monitores vão te colocar na plataforma de descida, prender todo o equipamento e dar as últimas orientações. É difícil prestar atenção, mas será mais fácil do que parece.

Preparados pra descer de rapel

Vale lembrar que todas as dicas passadas no treinamento do dia anterior não precisarão ser usadas. A descida e a subida serão controladas pelos monitores. Seu papel será apenas curti-las (e controlar o medo, se preciso).

A descida, normalmente, é feita de duas em duas pessoas: uma de frente pra outra. E logo no início, o espaço é mais estreito por causa de imensas rochas.

Com luvas, você vai liberar a corda com a mão direita e apoiar a esquerda num local específico do equipamento. É só tentar cadenciar os movimentos a 72 metros de altura.

Após passar pelo espaço apertado entre as rochas, tudo se abre e é possível ver a espetacular e imensa caverna escondida embaixo da terra. Eis o Abismo Anhumas!

Observando a caverna de perto

Descer demora uns 5 minutos. Lá embaixo, dois monitores aguardam nas plataformas de madeira montadas sobre um imenso lago de água cristalina.

Dentro do Abismo Anhumas

Na hora de definir e pagar o passeio, dá pra escolher fazer flutuação (pra observar o fundo do lago, enquanto nada na superfície) ou mergulhar com cilindro (apenas para quem tem o certificado específico de mergulho). Optei pela primeira opção.

Lá embaixo, a primeira coisa a se fazer é trocar de roupa e colocar a de neoprene. Ela serve para aquecer o corpo, já que a água costuma ser bem gelada: entre 18° e 20°C. Depois, é hora de pôr as máscaras e os snorkels para flutuar. O guia ajuda nessa parte.

A flutuação

Mesmo o interior da caverna sendo bem escuro, é possível enxergar embaixo d’água na hora da flutuação. Os olhos acostumam com a escuridão! Mas o monitor ajuda. Ele vai junto, iluminando vários pontos com a lanterna enquanto todo o grupo nada pelo lago durante meia hora.

É impressionante ver as formações rochosas de milhões de anos e pequenos lambaris nadando pra lá e pra cá. Os peixinhos não crescem mais porque o ambiente é escuro e tem pouca comida. O ponto mais profundo do lago tem 80 metros! Vale prestar atenção no “silêncio ensurdecedor” que existe por ali.

Nadando no lago gelado do Abismo

Em seguida, após a flutuação, todos podem tirar as roupas térmicas e nadar um pouco apenas com a roupa de banho, pra sentir a real temperatura da água. Vale tentar algumas fotos, pedindo ajuda pro guia: ele usa as lanternas pra fazer a iluminação.

O passeio de bote

No trocador, dá pra se secar e colocar novamente a roupa seca e os calçados. Aí, é o momento de entrar no bote e fazer um passeio guiado sobre a água da caverna pra observar todo o interior com mais calma.

A ação da infiltração da água com calcário pelas paredes formou vincos e desenhos impressionantes ao longo dos milhões de anos. Algumas formações rochosas do Abismo Anhumas parecem até esculturas, tamanha a perfeição.

Passeio de bote por dentro da caverna
Foto: Alexandre Socci / www.abismoanhumas.com.br

Navegar por toda a gruta, ouvindo as curiosas histórias contadas pelo guia, dura uns 20 minutos.

Quando a navegação termina, chega a hora de retornar à vida real, voltando ao topo.

A subida

Até novembro de 2018, os turistas precisavam subir por conta própria até a saída do Abismo, lá em cima. Mas a atividade (que ainda é feita no treinamento) exigia muito esforço físico e muito tempo de cada um. Após uma enxurrada de reclamações, anos a fio, agora cada pessoa é içada até lá em cima.

O içamento é feito da forma mais raiz possível: usando a tração humana. Lá em cima, pelo menos cinco monitores caminham fazendo força para puxar um visitante por vez.

Turistas são içados por monitores pra fora do Abismo

O percurso de subida dura uns dois minutos e é possível curtir mais o visual da caverna nessa hora, sem se preocupar muito com os movimentos.

Vale a pena?

A aventura completa dura umas quatro horas. O valor é bem alto para um passeio, mas a experiência é, de fato, única.

Pensar que tudo aquilo ainda é praticamente intocado e que se formou há milhões de anos, milímetro por milímetro, dá a sensação de exclusividade. Isso contribui pro alto valor cobrado.

Além disso, os profissionais, a segurança envolvida e as licenças e normas pra manter o Abismo em condições perfeitas também encarecem o preço do ingresso.

Se você tiver dinheiro sobrando e quiser fazer uma viagem logo ali, pro centro da Terra, eu recomendo. Vai ser difícil você se arrepender, mesmo que o medo seja mais forte na descida.

É que a sensação de superação e a experiência vivida vão acabar não tendo preço mesmo.